Crítica | Um Natal Cheio de Graça

Nota
2

“- Como é que vai ser a reação deles quando souberem que a Bebela me fez de rena de natal?
– Tu vai chegar lá com uma namorada nova.”

Carlinhos vive uma vida regrada e, depois de 10 anos de namoro, resolveu pedir sua namorada, Bebela, em casamento na véspera da ceia de Natal da família, mas seus planos vão por àgua abaixo, literalmente, quando ele a encontra na banheira de casa o traindo com outra mulher. Desesperado, ele sai correndo do apartamento e esbarra em Graça,uma mulher completamente fora do normal que se propõe a fingir ser sua nova namorada na vindoura ceia de natal na mansão da avó de Carlinhos, a ricaça Lady Sofia, como uma estrategia para encobrir a traição de Bebela. Como se não bastasse toda a loucura que é proporcionada pela convidada desconhecida, que se revela capaz de botar a casa abaixo, Lady Sofia anuncia que naquela ceia, por recomendações médicas, escolherá o futuro presidente da Construtora Bragança-Salles, com Carlinhos sendo um dos principais indicados.

A premissa da dupla que resolve formar um casal falso para enganar a familia de um deles não é novidade, diversos filmes já exploraram esse clichê, que até já chegou a ser trabalhado em um filme de temática natalina com Amor com Data MarcadaUm Match Surpresa, que também são originais Netflix. Mas nem sempre uma formula repetida significa fracasso, talvez tenha sido por isso que os roteiristas Fil Braz e Carolina García e o diretor Pedro Antônio tenham decidido que seria uma boa aposta fazer uma versão brasileira desse clichê, trazendo Sérgio Malheiros e Gkay como casal protagonista, mas desde suas primeiras cenas a produção deixa pistas que é feita de escolhas que funcionam bastante e outras que são terrivelmente mal feitas, talvez até uma das principais tenha sido o casal protagonista e diversas falhas incluidas na trama. Para começar, devemos ser realistas ao constatar o quanto a introdução do filme é completamente desregular, criando uma situação extremamente mal construida para apresentar os protagonistas e construir seu encontro, como se o foco do roteiro fosse muito mais no desenrolar das comemorações natalinas do que realmente na preparação da história.

Toda a trama do longa é pautada em cima do contraste entre os tradicionalissimos costumes da familia Bragança-Salles, uma tipica família tradicional do Rio de Janeiro, com o jeito sem-noção de agir de Graça, que é construida seguindo o estereótipo da nordestina sem papas na lingua e sem educação, algo que incomoda inicialmente no filme, até que caia a ficha que estamos apenas vendo Gkay interpretando ela mesma. Gkay é claramente a base que faz o filme existir, tudo gira em torno dela e das suas constantes piadas, que apesar de nem sempre funcionar faz o filme caminhar, e o background que o filme proporciona à personagem para ser extremamente oportuno, apesar de ser um pouco plausivel, o que acaba levando a cenas forçadas e reações desproporcionais, além de dispor de um excesso de personagens estereotipados e mal aproveitados. Sérgio Malheiros não funciona no papel que recebeu, parece a todo momento que ele não está confortavel em cena, a participação de Noemia Oliveira como Solange parece cheia de potencial, mas o roteiro não lhe da espaço para brincar com a personagem o suficiente, e todo esse subaproveitamento se estende aos papeis de Flavia Reis como a expansiva Milu Marianna Armellini como a travadissima Íris, personagens que poderiam equilibrar bem o humor do longa mas que acabam tendo pouco tempo de tela. No final, até a desenvoltudo de Vera Fischer como Lady Sofia parece prejudicada pelas falhas do roteiro e pela forma como Braz e García parecem querer gastar tempo demais na protagonista e criar uma lição de moral que, apesar de muito bonita, não funciona da forma desejada.

Um Natal Cheio de Graça é uma história clichê, assim como tantas outras tramas natalinas, mas poderia ter sido bem melhor. O humor da personagem de Gkay soa exagerado em muitos momentos, construindo aquela personagem ‘maluquinha’ de uma forma que funcionaria melhor com uma atuação menos expansiva, talvez funcionasse bem melhor no estilo de humor de Thati Lopes ou Luisa Perissé, e acaba perdendo completamente o tom quando chegamos no arco dramático da personagem. Talvez uma direção mais regrada e um roteiro mais realista pudessem suprir as demandas que surgiram no longa, afinal o filme trata até de pautas queer de forma discreta e eficiente. Talvez, pensando de uma forma bem positiva, o filme poderia ter funcionado de uma forma muito mais eficiente se os papeis protagonistas fossem capazes de extrair o melhor do trabalho da dupla e se os coadjuvantes, que são nomes de destaque na comédia atual, pudessem ter mais espaço para se desenvolver, mostrando facetas e aprofundamentos mais engraçados para cada um dos diversos membros, coisa que até conseguimos ver com Tales de Victor Meyniel, que possui uma premissa exposta nos primeiros minutos, explorada discretamente no decorrer do longa, para no último ato surgir como base para uma excelente piada.

“- É briefing na noite da virada? Vocês tão doidas.
– É uma questão de fuso, né? Eu já tô no ano que vem falando com o Japão.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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