Crítica | O Mistério de Candyman (Candyman) [1992]

Nota
3.5

“Eles dirão que eu derramei sangue inocente. Para que é o sangue, se não para derramar?

Há anos circula pelas ruas a lenda de Candyman, um espírito vingativo que tem um gancho no lugar da sua mão direita, de que basta você falar o nome dele cinco vezes em frente de um espelho para liberta-lo para uma chacina sem fim. Todo o mistério ao redor da lenda acaba chamando a atenção da antropóloga Helen Lyle, que inicia uma dedicada investigação sobre a origem da lenda, escutando os relatos que tanto circulam nas ruas e buscando as supostas vítimas dessa entidade, um trabalho que a leva diretamente para confins do gueto local e, no ápice de sua incredulidade, a leva a executar o ritual, uma escolha infeliz que torna sua vida um pesadelo infernal.

Em 1986, Clive Baker lançou o conto “The Forbidden“, uma história que narra sobre o relato de uma lenda urbana que assombra a comunidade mais pobre de Liverpool e acaba chamando a atenção de uma estudiosa de classe alta. O conto de Baker logo chamou a atenção de Bernard Rose, grande amigo do escritor que viu na história a chance de fugir do padrão do terror hollywoodiano nos anos 90, um insight que levou o cineasta a adquirir os direitos e começar um roteiro. Visando evitar que o filme fosse redublado em sotaque norte-americano, Rose resolveu mover o enredo para os Estados Unidos, encontrando o cenário perfeito em Chicago e a locação ideal no Cabrini–Green, muito dessa escolha por conta do caso de Ruthie Mae McCoy, uma residente da região que estampou os jornais na época após ser morta por um intruso que invadiu sua casa através de uma abertura atrás do armário de remédios do banheiro, uma noticia que marcou tanto Rose que até o fez homenagear a senhora com as personagens Anne-Marie McCoy e Ruthie Jean. Arriscando tudo, o longa de Rose marcou história ao ser o primeiro filme conhecido a lidar com o conceito de lenda urbana nos cinemas, uma aposta que não só o fez se tornar um sucesso como o tornou um marco cultural e abriu portas para muitos outros sucessos que seguiram a mesma premissa.

Toda a premissa de Rose logo chamou a atenção em Hollywood, o que rapidamente fez com que Virginia Madsen e Tony Todd se oferecessem ao diretor para fazer parte do filme, dupla que acabou se tornando os protagonistas do longa apesar de não ser a primeira opção. Madsen cai como uma luva no papel da frágil antropóloga branca, ela cria um enorme contraste enquanto transita pelo gueto e desempenha magistralmente o papel da scream queen do longa, ela se importa com a verdade por trás de Candyman, busca entender os mais pobres e, mesmo sem acreditar na entidade, deseja entender o que assombra essas pessoas. A personagem rapidamente é arrebatada para um processo evolutivo intenso no momento em que cruza com o antagonista da trama, se afundando numa trama psicológica que nos deixa em dúvida dos limites da realidade. Porém é Todd quem mais imergiu na proposta, enxergando Candyman como seu Fantasma da Ópera pessoal, o ator acabou encontrando o papel que alavancaria sua carreira. Portando o perfil físico perfeito para o papel, Todd aceitou aguentar picadas ao contracenar com 200 mil abelhas reais e até encarar uma desafiadora cena onde ‘cospe’ cerca de 500 abelhas. O ator empresta ao papel uma crueza que nos cativa, e que só cooperou para tornar o papel tão famoso.

Cheio de nuances arrepiantes e de uma premissa envolvente, O Mistério de Candyman marca história ao unir seu roteiro inovador, suas emoções sangrentas e algumas performances encantadoras. Infelizmente a produção sacrifica sua magia ao trazer elementos que não se encaixam bem na trama adaptada, principalmente quando se trata da criação de Daniel Robitalle, o filho de um escravo que mora em Nova Orleans e é brutalmente assassinado após se envolver com a filha de um fazendeiro rico branco, um plano de fundo para o Candyman que acaba esquecendo completamente de explicar como o fantasma de Nova Orleans é levado a assombrar as redondezas do Cabrini-Green, aumentando o tom dramático e reflexivo da obra em detrimento da harmonia de seu roteiro fluido de Rose. Apesar da falta de sutileza, o clássico cult dos anos 90 fala com profundidade sobre racismo e desigualdade social enquanto explora o medo urbano.

“Com o meu gancho, eu te dividirei ao meio.”

 

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.

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