Crítica | Doentes de Amor (The Big Sick)

Nota
3.5

O comediante paquistanês Kumail e a estudante de graduação Emily se apaixonam, mas encontram dificuldades quando suas culturas entram em conflito.

Com todos os conflitos e discussões acontecendo no mundo, é interessante notar que cinema menor, de gênero, tem se mostrado bem eficiente em 2017. Logo no início do ano, o horror surpreendeu com Corra! e depois com Ao Cair da Noite, que traziam componentes provocadores a histórias circunspectas e amarradas. Pois bem, a comédia romântica não ficou de fora, e Doentes de Amor é um desses filmes que nunca se distancia do gênero ao qual se agrega, mas isso nunca (ou quase nunca) o impede de trabalhar seus temas subjacentes.

O comediante paquistanês Kumail Nanjiani interpreta ele mesmo aqui e o filme conta a história real do seu relacionamento com uma jovem americana, que a certa altura, fica doente e é internada em coma. Kumail chegou aos Estados Unidos com sua família aos 18 anos e nunca quis seguir a tradição de se casar com uma moça da escolha de seus pais, os quais também não são nada a favor que ele trabalhe fazendo stand-up em Chicago. E, com sua namorada no hospital, ele não só tem que estreitar relações com os sogros como também lidar com a arbitrariedade da família islâmica.

Todo o trajeto desse personagem é filmado como uma série de pequenas situações engraçadas da vida, só que de maneira um tanto natural e orgânica. O roteiro dá espaço para esse humor satírico situacional se estabelecer desde as primeiras cenas, com a interação muito convincente entre o próprio Kumail e Zoe Kazan (ótima), que conseguem a raridade em comédias românticas de seguir rumos tradicionais sem parecer esquemático ou previsível.

No mesmo passo está o diretor Michael Showalter (de Mais um Verão Americano), com sua câmera tranquila e uma paleta de cores pasteis, trabalham tanto a comédia como o drama sem perder a plateia. Os personagens de Holly Hunter e Ray Romano são fundamentais para essa dicotomia, ambos sincronizadíssimos entre si e favorecidos pelo roteiro – o contrário do núcleo da família de Kumail, um conflito que se arrasta além do necessário.

Nos seus melhores momentos, Doentes de Amor cria essa acidez no começo dessas relações improváveis e vai gradativamente tornando-as mais tênues e até comoventes, e é nesse ponto onde os temas de cunho social, sobre atritos e preconceitos intrínsecos, funcionam tão bem e quase imperceptíveis. Por conta de sacadas inteligentes assim, também fica a sensação de que o filme está perdendo a oportunidade de ser ousado e subversivo e que ele acaba caindo não só em convenções fáceis, mas também se levando a sério. O terceiro ato, por exemplo, tenta
criar um senso de importância justamente no lado mais pipoca e familiar da história e não sabe exatamente a hora de cortar, fazendo o filme perder o passo e a atenção do espectador.

De qualquer forma, enquanto se concentra naquelas interações ácidas mas também cheias daquele toque humano que o seu ótimo elenco traz, Doentes de Amor funciona melhor não só do que a maioria das comédias românticas que há por aí, mas também de maneira mais envolvente do que muitas cinebiografias ambiciosas que ostentam muito mais produção do que conteúdo.

 

De Recife (PE), Jornalista, leonino típico, cinéfilo doutrinador.

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