Crítica | Coringa (Joker)

Nota
5

“Eu achava que minha vida era uma tragédia, mas agora percebo que é uma comédia.”

Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) é um palhaço que sobrevive à margem da sociedade. Almejando se tornar um comediante de stand-up e cuidando da mãe doente (Frances Conroy), o rapaz se vê constantemente humilhado, satirizado, oprimido e sendo motivo de chacota por todos aqueles que vivem ao seu redor. Semanalmente, Arthur precisa se encontrar com uma assistente social devido a seus distúrbios mentais enquanto lida com uma condição neurológica que lhe desperta uma risada involuntária nas horas mais inconvenientes e nos lugares menos oportunos. Mesmo com tantas dificuldades, Fleck tenta encarar a vida com bons olhos e com um sorriso em seu rosto. Mas, após sua demissão, o comediante entra em um declínio psicológico que desperta o pior de si e inicia um movimento popular contra a elite de Gotham City, da qual Thomas Wayne (Brett Cullen) é o maior representante.

Coringa sempre foi um dos vilões mais emblemáticos dos quadrinhos. Ensandecido e imprevisível, o personagem já passou por várias representações: algumas lendárias e outras extremamente esquecíveis. Mas o que levaria a DC a mexer mais uma vez em seu antagonista mais amado? Qual seria a justificativa para um filme solo do vilão e como, em nome dos deuses, isso poderia funcionar?

Antes de mais nada, Coringa é um filme único que se distancia de qualquer coisa que já vimos com um filme de quadrinhos. Com um ar mais realístico e bem menos cartunesco, o longa nos entrega um complexo estudo de personagem que nos desperta com maestria para os problemas e barbáries da sociedade, que são enfrentados por Arthur.

Dirigido por Todd Phillips, o filme se mostra incômodo e indigesto desde seus primeiros minutos. Com uma tonalidade sépia, acompanhando toques distintos de amarelo, azul e verde, para cada humor latente do protagonista somos introduzidos a uma sociedade decadente onde o indivíduo é esquecido e seus problemas pouco importam para os demais.

Gotham nunca foi tão real em tela. Seus montes de lixo, sua podridão sem controle e o ar aterrorizante de seus subúrbios são apresentados de uma maneira verossímil, o que nos deixa desconfortáveis ao refletir o caos político, social e econômico enfrentados por seus cidadãos. Mas é no seu protagonista que o longa encontra seu verdadeiro tesouro.

O filme bebe diretamente de obras como Taxi Driver e O Rei da Comédia, fazendo-nos analisar os pensamentos  de seu protagonista ao mesmo tempo que nos faz criar empatia por sua jornada. Em nenhum momento ele tenta glamourizar as ações de Fleck, mas foca em trazer uma viagem incomoda sobre seu ponto de vista deturpado.

Em vários momentos, o longa apresenta indícios de que seu protagonista pode distorcer a realidade para trazer conforto a si, afinal, ele que conta sua história. Mas, mesmo sentindo pena do mesmo e despertando nossa empatia, o longa deixa claro quando uma linha é atravessada e nos deixa perplexos com a audácia e a loucura que vem a seguir.

Phoenix nos traz um Arthur complexo e quebrado que guarda um turbilhão de pensamentos incômodos e uma vontade tremenda de se encaixar na sociedade (mesmo não sabendo bem como fazer isso). Desde sua risada incômoda, que parece vir rasgando do fundo do estômago ou forçada em vários momentos pelo personagem por achar que é o que o momento pede, até sua linguagem corporal, tudo em Arthur é desconcertante. Se para muitos a risada é uma cura, para Arthur ela é um sinal de dor e desconforto.

O processo de transformação do ator e seu controle sobre o corpo são impressionantes. Fleck é magro e cheio de ângulos, com protuberância ósseas que traz uma representação incomoda e brutal. Carregando em seu andar todo o peso de seus sentimentos e tentando encobrir na face a força de sua dor e descontentamento. Acompanhamos seu jeito mais contido e reprimido até o desabrochar gracioso que acompanha a insanidade de sua nova persona, com gestos mais amplos e floridos sem medo de se esconder do mundo. O personagem parece reagir mais às coisas ao seu redor do que premeditá-las.

Do início ao fim Phoenix nos mostra uma atuação monstruosa e nos deixa embasbacado e vidrados em cada singelo movimento. Sua performance é rica, complexa e dramática, trazendo sutilezas e nuances poderosas ao personagem e roubando todo e qualquer holofote para si. É inegável que ele é o dono do filme e não seria loucura imaginar a indicação ao Oscar pelo seu trabalho, trazendo um dos melhores papéis da sua carreira.

Os coadjuvantes giram em torno do protagonista e têm plena ciência que o foco está nele em todos os momentos. Zazie Beetz faz um ótimo trabalho como Sophie, interesse romântico de Arthur, assim como Frances Conroy, em sua versão fragilizada da doce Penny Fleck. Robert De Niro apresenta uma das maiores referências a O Rei da Comédia, ao viver o papel oposto como o apresentador Murray Franklin, trazendo cinismo e acidez ao astro televisivo.

Brutal e incômodo, Coringa tem tudo para se tornar um clássico imediato. Trazendo uma leitura profunda sobre a psique de seu protagonista, o longa deve (e precisa) ser debatido e estudado, além de delimitar um novo caminho para a tão famosas histórias de quadrinhos a partir daqui. Dilacerando nosso emocional e nos deixando colados na cadeira, o longa nos entrega um dos melhores filmes do ano e entra no hall de grandes produções da sétima arte.

“Ah, Murray, só uma coisinha. Quando me chamar, pode me apresentar como Coringa?”

Preso em um espaço temporal, e determinado a conseguir o meu diploma no curso de Publicidade decidi interagir com o grande público e conseguir o máximo de informações para minhas pesquisas recentes além, é claro, de falar das coisas que mais gosto no mundo de uma maneira despreocupada e divertida. Ainda me pergunto se isso é a vida real ou apenas uma fantasia e como posso tomar meu destino nas minhas mãos antes que seja tarde demais...

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