Crítica | Elvis

Nota
4.5

“Essa é a história de como uma criança pobre se tornou um super-herói através de seus poderes musicais abençoados por Deus e pelo gingado de seu quadril dado pelo Diabo.”

“You ain’t nothing but a hound dog”

Seguindo a onda de cinebiografias do mundo da música, foi trazido até nós o espetáculo explosivo que é a história daquele que foi e é considerado o Rei do Rock: Elvis Presley. A obra embarca na difícil tarefa de transportar para as telas toda a trajetória, do anonimato ao estrelato meteórico, de um dos maiores artistas que os EUA já conceberam. Engana-se, porém, quem acha que assistirá uma contação da história de forma meticulosa e centrada, Elvis é um filme feito para lhe encantar acima de tudo.

Um ponto importante a ser dito sobre o filme é que não se trata de uma obra de protagonista único, o nome do filme pode ser Elvis, porém facilmente poderia ser Coronel Tom Parker (Tom Hanks) por conta da narrativa escolhida por Baz Luhrmann (O Grande Gatsby, Moulin Rouge) ao roteirizar e dirigir o filme. Entendam: não existiria Elvis Presley (Austin Butler) se não existisse primeiramente o ilusionista Coronel Tom Parker, seu empresário, amigo e razão da montanha-russa que sua vida se tornou. A abordagem da história ser narrada pelo ponto de vista do Coronel aproxima o público do outro lado da vida do Rei do Rock, sendo por trás do misticismo de sua ascensão ao estrelato e descida até o que seria visto como sua queda.

O filme pode parecer pecar em alguns aspectos para o telespectador mais atento como, por exemplo, a crítica ao fato de Elvis servir como um “usurpador” do rock, originalmente vindo das comunidades negras, e atingir patamares que seus originários não conseguiriam graças a enorme segregação que ocorria nos EUA no período. Durante toda a dinâmica do filme esse assunto é trazido de diversas formas e é o principal motor para a transformação do Rei. Desde sua infância em comunidades negras pobres ao estrelato Elvis esteve conectado, da forma como foi transmitido durante o filme, ao poder do Rock.

A narrativa veloz com cortes e cores vibrantes faz lembrar a dinâmica de O Grande Gatsby, outro filme de Luhrmann, com toda sua fluidez e pouco tempo para respirar diante da magnitude do que está sendo apresentado em tela, nisso é preciso concordar que, para uma cinebiografia, poderia ser algo negativo por deixar muitas falhas na história e pontos sem desenvolvimento porém, especificamente para o que foi escolhido mostrar em tela, essa escolha criativa funciona por uma única razão: essa não é uma história de um cantor e sua cinebiografia. Essa é a história de como uma criança pobre se tornou um super-herói através de seus poderes musicais abençoados por Deus e pelo gingado de seu quadril dado pelo Diabo.

Elvis é um filho amoroso que vale por dois, desejando sempre poder dar à sua mãe, Gladys (Helen Thomson), tudo do bom e do melhor, que ele sabe que ela merece, sendo Graceland, seu rancho, um dos presentes que ele mais sonhou em poder dar. Seu arco dramático, de apoio e preocupação e a interação entre Thomson e Butler, respectivamente mãe e filho, é um dos pontos altos dessa obra que traz a carga emocional mais que necessária para o filme. O mesmo não podemos falar da relação com o pai, Vernon (Richard Roxburgh), que fica meio apagado e tendo sua figura paterna substituída pela excelente e revoltante interpretação do Coronel Parker feita por Tom Hanks. Ao saber que se trata de uma pessoa real e que fez tudo o que fez pensando única e exclusivamente nele a possibilidade de você sentir o quanto o mundo é injusto é enorme.

Dentro de sua própria lógica e dinâmica, Elvis é a obra que transporta você para o mundo mágico e eufórico da trajetória do Rei do Rock, cegando-o com os holofotes e botando para sentir o poder divino da música se apossando de você, até que esteja em um palco usando lantejoulas e dançando como se estivesse possuído. Novamente: não é a história de um homem e sim daquele que se tornou um super-herói.

“If you’re looking for trouble
You came to the right place
If you’re looking for trouble
Take a look right at my face”

 

Pernambucano, jogador de RPG, pesquisador nas áreas de gênero, diversidade e bioética, comentarista no X, fã incontestável de Junji Ito e Naoki Urasawa. Ah, também sou advogado e me arrisco como crítico nas horas vagas.

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