Crítica | Obsessão (Greta)

3,0
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Em cada década predomina uma tradição de suspense, e em nenhum outro período se explorou de maneira tão bem sucedida o “stalker movie” como nos anos 1990. Fotografia lavada, personagens bonitos e com uma vida sadia, e então, o rompimento: alguém, que parecia inofensivo(a) em princípio, inicia uma obsessiva perseguição pelo(a) protagonista. Obsessão, ou, no título original“Greta”, nem de longe reposiciona essa premissa, mas coloca uma grife de talentos num projeto que, sem ele, certamente cairia no esquecimento completo.

Nova na cidade de Nova York, Frances (Chloë Grace Moretz), está se adaptando ao seu novo estilo de vida, ao lado de sua melhor amiga (Maika Monroe), com quem divide o apartamento. Numa viagem diária de metrô, ela encontra uma bolsa feminina perdida no acento, olha a identificação/endereço, e resolve devolve devolver à dona, uma sexagenária solitária chamada Greta (Isabelle Huppert). Como o passado de Frances está marcado pelo recente falecimento de sua mãe, o instinto protetor e maternal de Greta lhe conquistam facilmente; claro que, sem tanta demora, a insistente presença da estranha vai ganhando contornos perturbadores.

Diferente Louca Obsessão ou A Mão que Balança o Berço, o filme dirigido e coescrito por Neil Jordan propõe mais uma ambientação urbana e mais aberta do que claustrofóbica – preservando o elemento interno em momentos-chave. A lógica visual de Jordan é coerente, apostando em cores pastéis e suaves que contrastam com os momentos mais escandalosos da trama. E felizmente a boa direção funciona tanto para as sequências externas (uma em particular é deliciosamente inverossímil) e para as perseguições em escala “caseira”. Chloë Moretz, uma atriz simpática e de trabalhos comumente funcionais, desempenha bem a figura ingênua e carente que a personagem pede – e já merece o mérito por não desaparecer diante do magnetismo de Isabelle Huppert. A atriz francesa, brilhante como sempre, entende o espírito B do projeto, e tira até senso de humor nos momentos mais aleatórios possíveis.

Sem inovações estruturais e cedendo constantemente aos chavões consagrados (da polícia incompetente ao cachorro com destino óbvio), o roteiro oferece, no entanto, boas surpresas entre o segundo e o terceiro ato que acabam quebrando a monotonia de ver exatamente aquilo que se já se espera. Em outras palavras, Obsessão é um filme de lógica previsível com viradas isoladas um tanto revigorantes. E não deixa de ser curioso que, mesmo sendo produzido, escrito e dirigido por homens, toda a ação se desenrola sem nenhum personagem masculino de peso, apostando todos os seus maneirismos narrativos em dois talentos que sustentam tudo com tanta honestidade.

 

De Recife (PE), Jornalista, leonino típico, cinéfilo doutrinador.

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