Nota
Lançado em 2013, Tomb Raider marca um reboot fundamental da icônica franquia desenvolvida pela Crystal Dynamics e publicada pela Square Enix. Disponível para PlayStation 3, Xbox 360 e PC, o jogo surge num cenário onde aventuras de ação com protagonistas femininas ganhavam espaço mais maduro e realista, afastando-se da caricatura dos anos 90. A proposta aqui é clara: contar a origem da jovem Lara Croft, transformando-a de uma exploradora inexperiente em uma sobrevivente resiliente. Esse reboot não só renovou a série, mas também estabeleceu um padrão para jogos do gênero “ação-aventura” da geração passada, ao misturar narrativa intensa com gameplay que privilegia a imersão. É uma resposta à necessidade de atualizar a fórmula, dialogando com títulos como Uncharted, mas com uma pegada mais sombria e brutal.
“HÁ SEMPRE ALGO POR TRÁS DOS MITOS”
Visualmente, Tomb Raider impressiona pela atenção aos detalhes, texturas bem trabalhadas e um design de personagens que aposta no realismo. A ambientação da Ilha de Yamatai é composta por florestas densas, ruínas antigas e cavernas claustrofóbicas, todas com ótimo uso de iluminação dinâmica e efeitos climáticos que colaboram para a imersão. Embora as expressões faciais estejam um pouco datadas para os padrões atuais, em 2013 estavam entre as melhores do gênero, transmitindo bem o sofrimento físico e emocional de Lara. Há uma coesão estética que faz com que cada ambiente pareça parte de um ecossistema orgânico, e não apenas um cenário artificial.
A jogabilidade segue a lógica dos jogos de ação moderna: há um sistema de cobertura funcional, tiroteios intensos e fluidez nos movimentos de escalada, salto e interação com objetos. A progressão da personagem é bem construída, permitindo upgrades de armas e habilidades em fogueiras que servem como pontos de descanso e fast travel. O combate tem peso, com uso satisfatório de arco e flechas, pistolas e escopetas, e a furtividade é simples, mas funcional.
Além da fluidez nos controles e na exploração, um destaque marcante é o uso do arco, que vai muito além do simples ato de atirar flechas. Suas funcionalidades são inúmeras: é possível atirar com precisão para eliminar inimigos, criar tirolesas que permitem acessar áreas distantes, atear fogo em pontos estratégicos para provocar destruição ou distração, e até utilizar as flechas como facas em combates corpo a corpo. Essa versatilidade torna o arco uma ferramenta essencial, reforçando a sensação de sobrevivência e engenhosidade da Lara em um ambiente hostil. Apesar disso, há momentos em que a dificuldade parece calibrada demais para favorecer a ação, comprometendo o aspecto de sobrevivência.
As mecânicas são um dos maiores trunfos do jogo. O sistema de caça e coleta de recursos adiciona uma camada de imersão e reforça o tom de sobrevivência. A exploração é incentivada por áreas semiabertas, relíquias escondidas e tumbas opcionais que funcionam como puzzles ambientais. Ainda que curtas, essas tumbas remetem às origens da franquia e são recompensadoras, dando uma pausa bem-vinda no ritmo frenético da narrativa. O equilíbrio entre combate, exploração e momentos de narrativa interativa é, no geral, bem executado, ainda que não livre de excessos de QTEs.
“VOCÊ É UMA CROFT”
A história funciona como uma narrativa de origem, acompanhando Lara Croft em sua primeira expedição, que rapidamente se transforma em um pesadelo após o naufrágio na Ilha de Yamatai. Com um tom mais maduro e emocional, o jogo abandona a heroína estereotipada em favor de uma personagem em construção, forjada pelas situações extremas que enfrenta. O desenvolvimento da protagonista é gradual e crível, e mesmo que alguns personagens secundários não tenham tanto espaço, eles cumprem seu papel na progressão da trama.
A ambientação é rica em detalhes e construída de forma inteligente para que cada região da ilha conte uma parte da história — desde vestígios de uma civilização antiga até bases militares abandonadas e templos misteriosos. A direção de arte consegue harmonizar o realismo técnico com toques sobrenaturais que surgem com naturalidade na narrativa. A sensação de isolamento e ameaça constante é reforçada tanto pelo design das fases quanto pela escolha de cores e iluminação, que criam tensão até nos momentos mais calmos.
O elenco de personagens é um ponto forte na construção da narrativa. Lara Croft é apresentada com uma evolução convincente, começando como uma jovem inexperiente e, aos poucos, se transformando na aventureira destemida que conhecemos. Jonah Maiava atua como seu fiel aliado e suporte emocional, trazendo uma presença humana essencial para equilibrar o clima de tensão. Roth, o mentor e figura de autoridade, acrescenta uma camada de mistério e responsabilidade, enquanto Sam Nishimura oferece apoio técnico e amizade. Por outro lado, Mathias, líder da seita Solarii, é um antagonista que imprime um tom ameaçador e sombrio, motivando grande parte dos conflitos. Já Reyes, membro da expedição rival, funciona como um personagem que adiciona complexidade e imprevisibilidade ao enredo, refletindo as tensões humanas dentro do grupo.
A trilha sonora, composta por Jason Graves, é um dos pontos altos do jogo. O tema principal de Lara é melancólico e crescente, traduzindo musicalmente sua transformação. Os efeitos sonoros também merecem destaque: os sons ambientes da ilha — vento, tempestades, animais — são imersivos e utilizados de forma intrínseca ao enredo para aumentar a tensão. As explosões, disparos e quedas têm impacto sonoro satisfatório, e o uso do silêncio em momentos estratégicos mostra o cuidado na construção da experiência sonora como parte essencial da narrativa.
“NO ONE LEAVES”
Apesar de linear, Tomb Raider oferece conteúdo adicional suficiente para estender a experiência além da campanha principal. As tumbas opcionais, documentos e relíquias espalhados pelo mapa incentivam a exploração cuidadosa e proporcionam insights sobre a história do local e de seus habitantes. Há também desafios ambientais e colecionáveis bem distribuídos, que agradam jogadores completistas sem se tornarem maçantes. A estrutura de progressão por zonas permite revisitar áreas anteriores com novas habilidades, desbloqueando locais antes inacessíveis.
O jogo recebeu alguns DLCs, mas a maioria deles focada no modo multiplayer, que é funcional, porém pouco memorável. A ausência de expansões narrativas relevantes é um ponto fraco, especialmente considerando o universo rico apresentado no modo principal. Mesmo assim, o conteúdo base já entrega uma experiência sólida e satisfatória, com um ótimo equilíbrio entre narrativa, combate e exploração.
Tomb Raider (2013) não apenas atualizou uma das franquias mais icônicas dos videogames, como também elevou os padrões do gênero de ação-aventura. A construção emocional de Lara, o ritmo cinematográfico e a qualidade técnica do jogo fizeram dele um marco na reinvenção de protagonistas femininas nos jogos eletrônicos. Mesmo mais de uma década depois, continua sendo uma referência quando se fala em reboots bem-sucedidos. Seu legado se estende às sequências diretas e a outros títulos que tentaram replicar sua fórmula, com mais ou menos sucesso.
“Um famoso explorador disse que a grandeza está naquilo que fazemos, não em quem somos”
Icaro Augusto

Sonhador nato desde pequeno, Designer Gráfico por formação e sempre empenhado em salvar o reino de Hyrule. Produtor de Eventos e CEO da Host Geek, vem lutando ano após ano para trazer a sua terra toda a experiência geek que ela merece.